sexta-feira, 29 de maio de 2009

O Bairro Alto

Fado corrido
vinho dançado
fado sombrio
vinho despejado
na noite
numa esquina do Bairro alto

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Os teus cabelos longos

O teu negro cabelo cai-te pelos ombros
e brilha quando cantas
por breves instantes
os teus olhos, entreabertos
olham-me profundamente
como o fado me toca no vinho
como o vinho me toca no fado

A tasca e o mármore, na sombra

A mesa de mármore
branco e castigado pelos anos
de lamentos e alegrias.
No canto da tasca
que já não existe
zangado,
bebo na sombra

A agonia

Esta noite não estou só.
Com meus sonhos,
no meu sono acordado,
canto o meu simples fado de
sonhos enrodilhados
no passado
que como maldição me persegue no presente
com eles
com ele
tudo canto
espicaçando tudo junto no meu peito repleto
dando graças ao vinho
bebo, doendo
martirizando-me
e uma estranha felicidade
acompanha esta
agonia

O Vinho e a bondade de Deus

Estou extasiado,
pela bondade de Deus
pois só de Ti poderia vir
este vinho tão bondoso

O amor da mulher e do homem

Se no amor
o desepero dum homem
por uma mulher
é grande
imenso deve ser
o duma mulher
deixo-a chorando
e fadando
e bebo nos braços doutra
pra não me matar
amando

O amor puro, Deus e o vinho cantado

Este amor puro
esta voz chorada
na bebedeira da noite
esta voz cantada
velha e vagabunda
a Deus entregue
o amor apaga-se
e Deus deu-me o vinho

A Noite

Já nas últimas
Ainda tenho uma garrafa
dum vinho d'algures
d'algum lugar seco
e encurtilhado
frente ao mar calmo
sentado
qual lobo velho
na areia fresca da noite
lua mergulha a sua luz nisto tudo
e em todos os meus sentidos
e um pedaço de pão
d'algum lugar seco
e encurtilhado
e o tinto
como a noite
escorrega livremente


http://www.youtube.com/watch?v=1A-0ZUqAdHo&feature=related

Numa casa Portuguesa

"Numa casa portuguesa fica bem
pão e vinho sobre a mesa..."
Se pensarem bem nisto, é muita verdade junta.

Dor e beber

Hoje ouvi de novo a Amália a cantar a "Mariquinhas"....
"...pois dar de beber à dor é o melhor..."
Como povo sofredor que somos, se assim fizermos, estaremos a ajudar a economia nacional consumindo muito vinho e muita ginginha
Ah grande Fadista.

domingo, 24 de maio de 2009

Estupidez, vinho e amor

A maldade duma mulher é
comparável
à estupidez dum homem
não bebas sem amor

Deus e o vinho

Sóbrio!
pergunto
e não tenho resposta
ébrio!
pergunto
e estou agradecido

Atrevimento

Tanta mentira
tudo é tão grande
tudo é tão imenso
divido-me
corto-me
entrego-me
e não existe fim
que atrevimento dizerem que Deus disse
eu bebo e sei que nada sei

O vinho e Deus

Olho as estrelas
nas noite de julho
deitado
meu Deus
como tudo é belo
choro

O espírito

Os maus bebem
e são maus
Os bons bebem
e são bons
e todos bebem
e são como todos
não há maior harmonia

Beber com uma mulher

Quando beberes com uma mulher
serve-a mais do que te serves a ti

As Dunas do Alentejo

As dunas do Alentejo
secam-me garganta
A maresia quebra-me o passado
ao beber o primeiro copo
na tasca mais proxima,
penso no coitado do passarinho
que frito
com alho
com vinho
jaz no meu prato
....~
quem me provará
estará sentado com vista pró mar?

O velho Mestre

Ah
Meu velho Mestre
pelo menos contigo
nunca tinha duvidas

O vinho e Deus

Se nada está provado
daqui a pouco
quando não existir
não existirei
de que serve não beber?
Deus!
Como amo Deus!
....?....!

O inverno

Inverno
rigoroso
chego de viagem com o meu mestre
aquecemos umas brazas
ardem debaixo da mesa
bebemos
choro

O vinho e o amor

Um amigo bebe um vinho novo
alegremente
dá-me uma garrafa
amizade
choro

Portugal e o vinho

É mesmo verdade
tenho espinhos no meu coração
picam
doem-me
prefuram-me
tudo com dor
contínua
constante
como um rio
como bom português
nada recuso
e aceito mais um copo

Obrigado meu Deus

Que coisa estranha
o vinho
quando estou triste, entristece-me
quando estou alegre
alegra-me
só de Deus poderia vir tal dádiva
obrigado meu Deus

A Rainha Calinacho

A Rainha Calinacho
visitava o meu avô
sentava-se numa caixa
qual trono
e bebiam pela noite adentro
Que saudades das coisas que nunca poderia ter vivido

O vinho e o desterro

Cuanhama
tudo por Deus foi criado
inferno
de calor
desterrado,
de tudo
a seca de anos
os anos de seca
o vinho

O vinho e a história

Estou certo
de que o vinho do próximo ano
será melhor do que este
isto é história

O vinho e a solidão

No campo

o cheiro da esteva
o fim do dia
a noite que chega
os cheiros
os sons
os movimentos,
do entardecer
Não há solidão maior
do que o olhar para a garrafa vazia

O vinho e o atrevimento

Bebo e
bebo
e
bebo
olho à minha volta
atrevidos!
porque pensam eles que são melhores?

O Vinho e a pobreza

Estou nas lonas
bebo vinho
como pão
estou bem

O vinho e o pão

Interessante:
no outro dia, uns amigos meus recusaram comer pão de um outro amigo que amassara o pão
pois viram que o suor dele caia na massa
mas dizem que o pão caseiro é o melhor
isto é uma contradição
obviamente esses gajos não bebem
nem sentem

O vinho sem amor, irrita

Antes arrependia-me
agora borrifo-me
.,......
mas irrita-me
este vinho não era de boa qualidade
não foi feito com amor

O vinho e o fado

Na tasca
guitarras e maus fadistas
vinho no copo sempre a encher
fado
Olho minha volta
fado
trocam-me os copos
olho à minha volta
fado
ah
se não fosse o vinho

O Vinho e a utilidade

É uma utilidade,

o vinho

O vinho e o jogging

Há pessoas que
correm
eu
bebo

O vinho e a saudade

Estou só
sinto saudade de algo
pois sou português
há espinhos que penetram profundamete dentro do meu coração
e o meu espirito carrega com este fardo
que aumenta de hora a hora
bebo
e o vinho descobre
em mim
que tudo isto é hilariante

A vida de Padre

Se tivesse ido para Padre
nunca teria chegado a estas conclusões

O final

Claro que bebo whiskey
porque há o costume nefasto de não servir vinho
no final

A família e o amor

A família é importante
mas
não há maior alegria do que beber
com aqueles que te amam

O Tudo e o Nada

Estando sóbrio
não entendo o infinito que por Ele foi criado
Estando ébrio
estou Nele
sou Dele
a Ele pertenço
Não há principio nem fim
Não há ser ou não ser
Não há o Nada nem o Tudo
Não há o Tudo nem o Nada
e
o Tudo vem do Nada

isto descobri quando tinha 16 anos

Deus e a ressaca

Deus permeia-me
Deus é-me
Deus deu-me
Deus criou-me
Por mais que tente,
não há ressaca de Deus

O vinho e a religião

O vinho e a sinceridade vão de mão em mão
e a religião?

O Vinho e a obscenidade

Quem não bebe ,
age como se fosse pudico.
Isso é obsceno

Os Padres e eu

Não vejo diferença alguma entre um Padre e eu
temos a mesma cultura
os mesmos estudos
as mesmas ovelhas tresmalhadas
os mesmos pecados que só Deus conhece
mas
Se ele beber
temos algo em comum

o Vinho, a Missa e o Padre

O almoço acaba à noite
a Tia,
vai à missa
ela e o Padre tem algo em comum

Ele e ela

Ele diz: a minha mulher não pode beber
aaaah?
porque ela fala quando bebe?

Os casados e os solteiros

sou solteiro e livre
bebo e bebem comigo
os casados esperam que eu me comporte, como casado
que pensem na sua vida antes de se casar;
eu pensei!

Eles e elas

Bebo e bebo
pouco a pouco os homens retiram-se
(por medo? pela verdade?)
ficam as mulheres
Eles sentem-se retraidos
elas curiosas

O esquecimento de Deus

Quando Deus esquece
O vinho compensa

Duas e mais uma

é sempre melhor abrir duas garrafas
duas devem ser colocadas cerca do fogão
uma terceira deve ser aberta para ir provando

À sombra do Chaparro

Do ribeiro retiro o garrafão
No calor de Agosto
Na sombra do chaparro
Tinto

Provador de vinhos

Essa coisa de povar os vinhos até é bom.
Mas é um grande desperdicio
O primeiro que gosto no vinho é o som
gosto então de ve-lo correr
e todo o copo encher
bebo-o depois provando-o sem vicio
inspiro-o e sorvo-o porque é de bom tom
pouso o copo e verto mais sem suplício
ao acabar nunca viro o copo ao contrário
não vá alguém pensar que sou ordinário

Isto não é um poema

Irritante

É irritante quando não acabam o vinho dos copos.
Gente maleducada

A sacristia

Na sacristia havia um ligeiro cheiro a vinho
Cheirava melhor que o Padre.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Omar Khayyam: algumas das minhas preferidas

Dreaming when Dawn's Left Hand was in the Sky
I heard a Voice within the Tavern cry,
"Awake, my Little ones, and fill the Cup
Before Life's Liquor in its Cup be dry."

.....

Come, fill the Cup,
and in the Fire of Spring
The Winter Garment of Repentance fling:
The Bird of Time has but a little wayTo fly--and Lo! the Bird is on the Wing.


.....


And if the Wine you drink, the Lip you press,
End in the Nothing all Things end in--Yes-
Then fancy while Thou art,
Thou art but what
Thou shalt be--Nothing--Thou shalt not be less.


.....

And David's Lips are lock't; but in divine
High piping Pelevi, with "Wine! Wine! Wine!
Red Wine!"--the Nightingale cries to the Rose
That yellow Cheek of hers to'incarnadine.

....

Then to this earthen Bow
l did I adjourn
My Lip the secret Well of Life to learn:
And Lip to Lip it murmur'd--
"While you live,Drink!--for once dead you never shall return."


.....


All my companions, one by one died
With Angel of Death they now reside
In the banquette of life same wine we tried
A few cups back, they fell to the side.


.....


Ah, make the most of what we yet may spend,
Before we too into the Dust Descend;
Dust into Dust, and under Dust, to lie,
Sans Wine, sans Song, sans Singer and--sans End!


.....


And, as the Cock crew, those who stood before
The Tavern shouted--"Open then the Door!
You know how little while we have to stay,
And, once departed, may return no more."


.....



And when Thyself with shining Foot shall pass
Among the Guests Star-scatter'd on The Grass,
And in Thy joyous Errand reach the Spot
Where I made one--turn down an empty Glass!



http://www.okonlife.com/poems/

Os Provadores

os provadores de vinho estão sempre sóbrios
que disparate
"Todos servem primeiro o vinho melhor e, quando os convidados já estão embriagados, servem o vinho menos bom. Mas tu guardaste o vinho bom até agora!"
João 2,1-11

Tunilingus

Gosto muito da cantiga da Tuna Tunilingus
"...se é branco ou tinto, pouco m´importa,
se não houver vou bater a outra porta..."
Quem a escreveu sabia por as coisas no devido contexto


http://tunilingus.wordpress.com/cancioneiro/

O velho e a adega

Era pequenino
e entrei pela adega
estava lá um homem velho
e vermelho
e tudo cheirava ao mesmo

Grande mulher

Era uma grande mulher
grande
e bebia grandes copos de vinho
fiquei horas com ela
As suas altas gargalhadas
o seus lábios rubros
do liquido sagrado
o sagrado realmente é superior ao profano

A minha família

A minha família gosta muito do vinho
....
ainda bem

Fazer amigos

Quem bebe
tem um sorriso mais honesto
A confiança torna-se assim a aliada do vinho

As manchas para a saudade

Entornaste o meu copo
mas o vinho caiu-me todo em cima

O vinho e o fado

Elas serviram-me vinho
a noite tornou-se uma alvorada
o último fadista adormeceu a cantar
Também, já não lhe percebia palavra

Na Rua da Escola Politécnica nº 60

Na rua da Escola Politécnica nº 60
há uma roseira de rosas da cor do vinho agreste
perfumadas como já não há nenhuma
mesmo perfumadas
Mas o Reitor mandou-nos dali para fora
quem regará a roseira
quem terá saudades dela
quem beberá o vinho da sua cor

O vinho e os seios firmes

gostei de ver o vinho escorrer por entre esses teus seios firmes
mas da proxima vez
serve-o num copo

As senhoras e o vinho

Dizem que as senhoras não devem servir o vinho
pois o que eu quero é que me sirvam
e mais

Irritação

Convidam-me e não me enchem o copo
isto irrita-me
bebo e demoram a enchê-lo
isto irrita-me

O Verão

Não quero ser interrompido
Nesta conversa longa
profunda
saudosa
com o calor
com a sombra
com o som suave das folhas secas pisadas pelo vento
com o vinho tinto
tinto
tinto

Canta o roxinol

Oiço o fado
lua nova
o cheiro do vinho e do tabaco
mas pela noite dentro
canta o roxinol
o cheiro das estevas e ervas quentes e terra seca e gretada
o vinho é tinto do alentejo

Caprimulgus Europaeus

É lua cheia
Estou na varanda
tenho caracois por mim colhidos
quentinhos
torradas
tinto
o canto do noitibó




http://www.xeno-canto.org/europe/species.php?query=gen:Caprimulgus+species:europaeus

O caracol e o vinho

Estou certo de que quando aquele caracol chegar à garrafa, ela já estará vazia

O chaparro

um chaparro velho
lembra-me sempre vinho tinto
um ribeiro vinho branco

Cheio de sede

Estou cheio de sede
tenho pão
tenho queijo

Coisas Darwinnianas

Numa festa
seguro um livro e cai-me das mãos
os copos seguram-se aos dedos
há coisas que são darwinianas

O Sentar

Ajudei o meu mestre a sentar-se
de novo
e enchi-lhe o copo
sentei-me
e enchi o meu copo
de novo

Pipa de vinho

Tenho a certeza de que entrei em casa
e a porta estava fechada
Os meus sapatos cheiram a pipa de vinho

Som

Que som suave
o verter duma garrafa

Debaixo

Debaixo da minha mesa
Tenho uma garrafa
Disso estou certo
Ao sair à rua
As pedras da calçada são-me simpáticas

Não há

Não há vinho que cure a saudade do copo de vinho de ontem

O meu velho mestre

Acompanho o meu velho mestre
Copo a copo
gesto a gesto
ouvindo
rindo
bebendo
Se ele fosse português
Sentiria saudades

Li Bai

Bebendo ao luar
Ergo entre as flores um copo de vinho
e convido o luar
Acabo também por convidar
a minha sombra
Mas a lua não sabe beber
e a minha sombra não me consegue acompanhar
Companheiros de um instante– a lua a minha sombra e eu – vamos brindar à primavera.
Enquanto canto a lua vagueia
Enquanto danço a minha sombra desespera
Esqueçamos tudo enquanto estivermos a beber
Que cada um se afastequando o dia chegar
Na longínqua Via Láctea
mais cedo ou mais tardenos voltaremos a encontrar

Jorge Sousa Braga, in: Jorge Sousa Braga (org.), O vinho e as rosas. Antologia de poemas sobre a embriaguez, Lisboa, 1955